A ninhada
Por mais que Luiza corresse, não conseguia superar a própria dor. Mas era só um arranhão, ela repetia para si mesma, como se apertando demais o machucado pudesse encontrar algum alívio.
No peito ofegante, a ânsia de um grito. Não, não era só mais um arranhão. Era um corte brutal e profundo. Uma grossa cicatriz marcada na carne.
A tarde era quente e a cidade estava agitada. Mas Luiza mal podia sentir os pés tocando o asfalto. O suor gotejava-lhe da testa. A cabeça latejava. Era como se sua vida tivesse sido suspensa no exato momento em que deixara o consultório no final daquela tarde.
Nas mãos, o envelope e sua sentença. Na alma, um imenso vazio. Por que ela?
Sem poder mais sustentar o peso que sua vida ganhara nas últimas horas, Luiza deixou-se cair, exausta, no banco da praça.
Sentia-se um galho seco. Uma árvore oca, incapaz de produzir frutos. E não sabia como contar ao marido. Justamente eles, que sempre planejaram uma família grande e feliz. Que sempre sonharam com a casa lotada. Com crianças correndo pelo quintal.
E agora a vida vinha como um vendaval, desordenando sua casa, tirando-lhe o equilíbrio, derrubando o varal onde ela estendera cada dia felicidade ao lado do filho tão desejado.
Lembrou-se de seus oito anos, quando ganhara um filhote de gato do avô. Da grande alegria que sentiu ao afagar aquele pêlo macio e de seu encantamento diante da fragilidade e da doçura do animal.
Lembrou-se também da imensa tristeza misturada com uma profunda culpa por ver a gata-mãe desesperada à procura de sua cria. De seus dias de angústia, vasculhando todo o quintal sem encontrar qualquer pista.
Agora era ela quem vagava pelas ruas exigindo sua ninhada. Farejando pela tarde triste alguma esperança de poder ter seus filhotes nos braços. E seu miado rouco e melancólico também atravessaria as madrugadas.
